segunda-feira, 2 de janeiro de 2012


Marcos Afonso de Oliveira

Novo salario mínimo prova que é possível avançar para salário mínimo constitucional
Marcos Afonso de Oliveira, secretário de imprensa da UGT
O salário mínimo necessário para o trabalhador suprir despesas básicas como alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência, como determina a Constituição Federal, deveria ser de R$ 2.349,26. O cálculo foi feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Ou seja, 3,77 vezes o atual mínimo de R$ 622,00, que começa a valer desde 1 de janeiro deste ano.
O impacto esperado na economia e na vida de pelo menos 48 milhões de brasileiros deve, ao mesmo tempo, servir de alerta para que tipo de Brasil teríamos com um mínimo que respeitasse a constituição e que melhoraria, automaticamente, a qualidade de vida, seja ele social, educacional e cultural de milhões de brasileiros mantidos, ainda, na rotina da sobrevivência, sem conseguir fazer com que eles (e elas) e seus filhos tenham acesso à verdadeira cidadania.
Mesmo assim saudamos o atual mínimo que resgata parte de uma dívida histórica do Brasil com seus trabalhadores mais humildes. Mas nos mantemos atentos e mobilizados para buscar mais, que além de ser possível, está definido em nossa Constituição.

Salário mínimo de R$ 622 acumula ganho real de 66% desde 2002
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) calcula que desde 2002 o salário mínimo teve crescimento nominal de 211%, saltando de R$ 200 para os R$ 622 a partir de hoje. Descontada a inflação do período, o ganho real foi 65,96%.
O percentual de aumento real de 2012 (9,2%) é o segundo maior na última década, conforme a Lei nº 12.382/2011, que prevê a restituição da perda da inflação no ano anterior mais o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) apurado no penúltimo ano pelo IBGE. Nota técnica do Dieese estima que o novo mínimo é “o maior valor real da série das médias anuais desde 1984”. O departamento também calcula que com o novo mínimo será possível comprar 2,25 cestas básicas, a maior proporção desde 1979.
Segundo o Dieese, 48 milhões de pessoas têm rendimento referenciado pelo salário mínimo. O maior grupo está entre os beneficiários da Previdência Social (19,7 milhões de segurados); seguidos de empregados (12,8 milhões de trabalhadores); trabalhadores por conta própria (8,7 milhões de pessoas) e mais de cinco milhões de empregados domésticos. O reajuste deverá irrigar a economia com R$ 47 bilhões mensais e gerar R$ 22,9 bilhões de incremento na arrecadação tributária.
Cada real acrescido no salário mínimo tem impacto de R$ 257 milhões ao ano sobre a folha de benefícios da Previdência Social. O peso na massa de benefícios é 46% das contas da Previdência. Cerca de 68% do total de seus beneficiários terão o reajuste.
A legislação do salário mínimo estabelece que além do valor mensal, o governo estabeleça valores correspondentes ao pagamento diário e por hora relativos ao mínimo. Assim, o trabalhador receberá R$ 20,73 por dia trabalhado ou R$ 2,83 por hora. (Agência Brasil)

Brasil tem o cartão mais caro das Américas
Os brasileiros que não pagam a fatura integral do cartão e entram no chamado crédito "rotativo" pagam possivelmente a maior taxa de juros do mundo, segundo levantamento da Pro Teste.
No estudo, a Pro Teste constatou que o brasileiro paga juros de 237,9% ao ano. Esse valor foi comparado com as taxas cobradas na Argentina, Chile, Colômbia, Peru, Venezuela e México.
Mesmo em países com taxa básica de juros acima da brasileira (11%), como Argentina (12,5%) e Venezuela (24%), têm juros do cartão menores que os do Brasil.
Na Venezuela, o rotativo custa 29% ao ano e na Argentina, 50%.
Segundo Hessia Costilla, economista da Pro Teste, mesmo que a taxa brasileira fosse cortada pela metade ainda seria mais que o dobro da segunda maior taxa entre os países pesquisados.
De acordo com a Pro Teste, os cartões de crédito têm sido o maior fator de endividamento dos consumidores porque as taxas do rotativo "se tornam impagáveis".
O quadro é preocupante, segundo a Pro Teste, porque atinge principalmente consumidores que só agora entraram no mercado de consumo, como aposentados, jovens e pessoas de baixa renda.
"As condições econômicas dos países relacionados, quando confrontadas com as do Brasil, mostram claramente que a taxa de juros praticados no Brasil realmente é exagerada. Parte da culpa cabe aos bancos", diz Costilla.
A Pro Teste sustenta que o processo de concessão de crédito pelo cartão é falho e que leva as famílias a terem vários financiamentos cujas prestações superam a renda mensal do devedor.
O modelo de cartão no Brasil se diferencia do de outros países por não distinguir quem paga o total da fatura e quem financia. Segundo a Pro Teste, isso leva à diluição do custo da inadimplência a todos os clientes, pressionando a taxa para cima. (Folha)
Novos personagens?
O adicional de ocupados na base da nossa pirâmide social reforçou a classe trabalhadora, equivocadamente identificada como uma nova classe média
A centralidade do trabalho, conferida pelo impulso das políticas públicas em pleno ambiente de recuperação econômica dos últimos anos, foi responsável pelo fortalecimento do segmento situado na base da pirâmide social brasileira.
Na década de 2000, por exemplo, foram 21 milhões de novos postos de trabalho abertos, sendo 95% deles com remuneração de até 1,5 salário mínimo mensal, capazes de permitir a redução tanto do mar de pobreza existente como do patamar extremo da desigualdade no interior do rendimento do trabalho.
Na década de 1990, o Brasil das políticas neoliberais abriu somente 11 milhões de ocupações, sendo 62,5% delas sem remuneração.
O adicional de ocupados na base da pirâmide social reforçou o contingente da classe trabalhadora, equivocadamente identificada como uma nova classe média.
Talvez não seja bem um mero equívoco conceitual, mas expressão da disputa que se instala em torno da concepção e condução das políticas públicas atuais.
A interpretação de classe média (nova) resulta, em consequência, no apelo à reorientação das políticas públicas para a perspectiva fundamentalmente mercantil. Ou seja, o fortalecimento dos planos privados de saúde, educação, assistência e previdência, entre outros.
Nesse sentido, não se apresentaria isolada a simultânea ação propagandista desvalorizadora dos serviços públicos (o SUS, a educação e a previdência social).
despolitizadora emergência de segmentos novos na base da pirâmide social resulta do despreparo de instituições democráticas atualmente existentes para envolver e canalizar ações de interesse para a classe trabalhadora ampliada. Ou seja, o escasso papel estratégico e renovado do sindicalismo, das associações estudantis e de bairros, das comunidades de base, dos partidos políticos, entre outros.
No final da década de 1970, estudos como o de Eder Sader ("Quando Novos Personagens Entram em Cena") buscaram destacar que o crescimento econômico da ditadura militar culminou com o novo movimento de ascensão do grande contingente de brasileiros oriundos da transição do campo para cidades.
Aquela mobilidade na base da pirâmide social, que havia sido contaminada pela precariedade das cidades e dos serviços públicos, foi capturada pelo novo sindicalismo e por comunidades de base, o que impulsionou a luta pela transição democrática e pelo aparecimento das políticas sociais universalistas. Isto é, a chave do rompimento à longa fase da cidadania regulada predominante no Brasil, como descreveu Wanderley dos Santos ("Cidadania e Justiça").
Ainda que no cenário derrotista das teses neoliberais vigente atualmente, elas parecem se renovar e ganhar impulso marqueteiro na agenda mercadológica do consumo. Isso torna a agenda das políticas públicas assentadas na centralidade do trabalho desafiada, posto que a força difusora de um conceito equivocado sobre alterações na estratificação social pode levar à dispersão e fragmentação da atuação do Estado.
O entendimento correto acerca do impulso ampliado da classe trabalhadora deveria ser acompanhado da transformação dos segmentos sociais emergentes em novos personagens pelas instituições democráticas atuais. Dessa forma, soergueriam os atores protagonistas da contínua luta pelas políticas públicas universais.

MARCIO POCHMANN, professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas, é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).